Uma exposição histórica foi inaugurada recentemente no Museu da História Alemã em Berlim. Pela primeira vez, obras de arte da coleção do Museu Yad Vashem, de Jerusalém, são exibidas no exterior – e justamente na Alemanha.
A mostra, chamada Arte do Holocausto, coincide com o 50º aniversário do restabelecimento das relações diplomáticas entre a Alemanha e Israel.
Estão reunidos 100 desenhos e pinturas que foram feitos pelos prisioneiros judeus dos guetos e campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. A maioria das obras retrata a dura realidade do cotidiano sob o regime nazista, do ponto de vista dos judeus.
O próprio fato de muitos dos trabalhos terem sobrevivido até hoje já é quase um milagre: eles foram escondidos ou contrabandeados por amigos dos artistas sob alto risco de serem punidos. Aqui estão as histórias por trás de alguns deles:
Pavel Fantl, 'A Canção Acabou' (1941-1944)
Esse colorido desenho acima é um dos poucos na mostra que retratam os próprios nazistas. “Assim que vi essa peça, tive que colocá-la na exposição”, diz o curador Walter Smerling.
Fantl era um médico nascido em Praga e conseguiu pintar em segredo no gueto de Theresienstadt, graças a um policial tcheco que lhe fornecia o material.
“Aqui, ele retrata Hitler como um palhaço... É preciso imaginar a coragem e o senso de humor desafiador do artista”, afirma Smerling.
Fantl foi deportado para Auschwitz com sua mulher e seu filho e morto pelos nazistas em 1945. Um trabalhador tcheco conseguiu tirar os quadros do gueto e os escondeu dentro de um muro.
Felix Nussbaum, 'O Refugiado' (1939)
Nussbaum é o artista mais famoso da exposição. Ele foi preso na Bélgica em 1940, mas conseguiu fugir e permaneceu foragido com sua mulher em Bruxelas.
Este quadro mostra o isolamento do judeu alemão. “Aqui, ele se pergunta: ‘para onde posso ir, onde posso morar, onde posso trabalhar e existir?”, afirma o curador.
Nussbaum mandou a pintura para seu pai, em Amsterdã, de onde foi transferida para um colecionador particular e vendida em um leilão.
O artista foi morto em Auschwitz ao lado de sua mulher, em 1944.
Moritz Müller, 'Telhados no Inverno' (1944)
Moritz Müller estudou pintura em Praga e abriu uma casa de leilões. Após a invasão da então Tchecoslováquia, ele foi confinado no gueto de Theresienstadt, onde produziu mais de 500 obras.
Este quadro mostra o gueto como um idílio pacífico. “É uma das peças de destaque da mostra porque não retrata ninguém – e os guetos eram superlotados”, explica Smerling.
A viúva de um militar austríaco comprou algumas das pinturas de Müller e as escondeu em sua casa. O artista foi morto em Auschwitz em 1944.
Nelly Toll, 'Garotas no Campo' (1943)
Nelly Toll é a única artista desta exposição que ainda está viva. Nascida em Lviv, hoje na Ucrânia, ela pintou este quadro aos 8 anos de idade, quando vivia escondida com sua mãe junto a uma família cristã. A obra retrata a liberdade pela qual ela tanto ansiava.
Toll atualmente vive no Estado de Nova Jersey, nos Estados Unidos, e viajou a Berlim especialmente para a abertura da exposição, tendo sido recebida pela chanceler Angela Merkel.
Bedrich Fritta, 'Entrada pelos Fundos' (1941-1944)
Das mais de 140 mil pessoas deportadas para o gueto de Theresienstadt entre 1941 e 1945, cerca de 120 mil morreram. Fritta nasceu na Boêmia em 1906 e viveu no gueto antes de ser levado a Auschwitz, onde morreu, em 1944.
Ele e outros artistas do gueto esconderam seus trabalhos dentro das paredes e muros. “O portão semiaberto é uma metáfora da morte. Não há uma alternativa visível, a única saída é a escuridão”, afirma Smerling.
A obra foi presenteada ao Museu de Arte Yad Vashem, em Jerusalém, pela Comissão de Documentação de Praga.
Karl Bodek e Kurt Conrad Löw, 'Uma Primavera' (1941)
Smerling e os demais curadores da exposição escolheram esta para ser a imagem central da mostra, apesar de seu pequeno tamanho.
Uma colaboração entre dois artistas detidos no campo de Gurs, no sul da França, a pintura mostra uma borboleta pousada em uma cerca de arame farpado, diante da vista ao longe das montanhas da fronteira com a Espanha.
“Esse quadro representa a autoafirmação dos dois como pessoas e como artistas, e articula sua vontade de sobreviver e sua esperança de futuro”, explica o curador.
Low, de Viena, conseguiu fugir para a Suíça, mas Bordek foi levado para Auschwitz, onde foi morto.
Leo Haas, 'Chegada do Transporte' (1942)
Haas, que sobreviveu à Guerra, foi destacado pela administração autônoma do gueto de Theresienstadt para fazer esboços arquitetônicos para as construções no local.
Mas ele também criou representações a tinta que eram muito bem compostas e arranjadas.
Como Nussbaum, Haas usou símbolos de aves de rapina para sugerir a onipresença da morte. Ele também pintou a letra “V” no canto esquerdo inferior do quadro, um símbolo da resistência underground.
“É uma imagem incrível, na qual o artista coloca a morte e a organização da morte, mas ainda é capaz de pensar na vitória”, diz Smerling.
Charlotte Salomon, Autorretrato (1939-1941)
Salomon tem três obras na exposição, incluindo esta. A pintora nasceu em Berlim e conseguiu ir morar com os avós na casa de Ottilie Moore, uma milionária americana, em Villefranche, no sul da França.
Ela continuou a pintar durante o exílio. “Neste autorretrato, tudo parece estar em movimento e ela parece estar mostrando algo da tormenta interior que sentia”, conta Smerling.
Salomon foi presa pela Gestapo com seu marido em setembro de 1943 e foi mandada para Auschwitz, onde foi morta. Ela estava grávida de cinco meses.
Fonte: BBC Brasil
Fonte Original: BBC Culture
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